Anos 1990: Criatividade a 1000 km/h

Os anos 1990 se caracterizaram definitivamente pela explosão de popularidade do Bodyboarding no mundo. No Brasil o esporte virou uma febre não só nas areias mas também na mídia, com imagens na TV Globo todo final de semana praticamente. Ao redor do mundo não foi diferente e junto com isso vieram uma série de empresas querendo capitalizar em cima disso, principalmente nos equipamentos e acessórios.

Já falei das marcas de surfwear aqui e dei exemplos com imagens inclusive, mas existiu também uma onda de pequenas e grandes marcas do próprio esporte desenvolvendo criações e ideias altamente inventivas. Algumas funcionavam e outras nem tanto, virando às vezes somente motivo de piada.

Vou listar aqui algumas que eu lembrei numa pesquisa rápida aqui no meu arquivo de revistas dos anos 1990, principalmente na revista Bodyboarding americana, que na época fazia a cobertura do que era o maior mercado no mundo.

1. Luvas A.P.E.

Nessa época era bem comum ver alguns dos principais bodyboarders havaianos (os melhores do mundo nesse período) usando um tipo de luva, que teoricamente ajudava na remada e também facilitava o “grip” na hora de segurar a prancha. Ben Severson era provavelmente o rider mais famoso a usar esse equipamento, no caso da marca “A.P.E.”. Na minha humilde opinião não teria algo pra te atrapalhar mais na hora de surfar (talvez usar um leash no pé junto com a luva). Mas o dinheiro do patrocínio tava ali e Ben Severson queria inteligentemente capitalizar ao máximo. A Morey Boogie também vendia uma versão dessas luvas, mas nenhum atleta do seu time as utilizava. Mike Stewart chegou a usar luvas no final dos anos 1980 também, mas depois acabou abandonando.

Ainda bem que essa fase das luvas passou, não é mesmo? 🙂

2. Morey Boogie Mach 8-TX / Mach SCS

A Morey Boogie era na época a maior marca em popularidade e números de venda, com uma linha extensa de modelos e um time estrelado de bodyboarders (que incluía Mike Stewart para se ter uma ideia). Isso dava margem pra arriscar ideias mirabolantes e negociar com a indústria de materiais de uma maneira diferente, como no caso dos fundos Surlyn, que nessa época já eram o padrão máximo de performance. Assim criou-se então o fundo texturizado chamado de “Air Speed Bottom”, com uma textura em baixo relevo que teoricamente captava ar entre o fundo e a água e fazia a prancha deslizar mais e ir mais rápido. Na prática a coisa era um pouco diferente e logo o uso desse fundo foi abandonado. A Mach SCS ainda tinha um sistema de canaletas pré moldado no fundo, algo que provavelmente foi a única vez que foi usado pelo que eu me lembro (vide imagem abaixo).

3. BZ Release Rails / BZ Air Concave

A marca americana BZ (que teve por muitos anos filial aqui no Brasil) disputava a liderança do mercado americano e mundial junto com a Morey Boogie, e não ficava atrás nesse quesito de novidades e invenções. As duas que mais me chamaram a atenção tem relação com essa ideia da Mach 8TX, de fazer a prancha ir mais rápido de alguma maneira. No modelo “Release Rails”, alguns buracos eram feitos superficialmente nas bordas perto da rabeta, pra criar uma zona de menos pressão, arrasto e turbulência, e por consequência gerar mais velocidade.

O outro modelo chamado “Air Concave” tinha um concave/canaleta bem no meio da prancha, também pra gerar essa mesma área de menor pressão e fazer com que a água passasse por ali mais rápido. Me lembrou de alguma maneira a ideia dos phazers utilizados pelo brasileiro Marcus Kung. Imagina hoje o que esse pessoal não inventaria com os robôs lixadores das fábricas atuais. 🙂

4. Pranchas com bloco de PU

Para se ter uma ideia do tamanho do mercado do Bodyboarding nessa época, marcas/shapers de pranchas de Surf acabavam se aventurando e criando pranchas de Bodyboard nos mesmos moldes, com bloco de PU e acabamento em fibra de vidro. É o caso da prancha da Insanity, uma marca americana. O outro exemplo, da marca Hypersonic Blade, tem o mesmo bloco de PU, mas nesse caso o bloco é revestido por uma cobertura de espuma de alguma densidade específica não informada. Fiquei imaginando a volta de um backflip nessas pranchas hoje em dia, seria da areia diretamente pro hospital.

5. Posi-Trak Channel System

Esse acessório aqui talvez seja pra mim o mais controverso, do ponto de vista funcional. A Posi-Trak anunciava seu sistema de canaletas com adesivo para serem coladas no fundo das pranchas, garantindo assim mais velocidade e controle. Na minha cabeça essas pequenas “vigas” iriam gerar apenas mais arrasto, deixando todo o conjunto mais lento. Não tem nada a ver com o sistema de canaletas normais que já vem na prancha, que apenas faz com que a água percorra um caminho maior, diminuindo sua velocidade e criando uma zona de maior “apoio”. Enfim, mais um item esquisito e sem muita funcionalidade produzido na época, e que acabou sumindo do mercado com o tempo.

6. Body Pro Pocket Rocket

Essa prancha da marca Body Pro do ano de 1992 era algo bem diferente (mesmo com tantos designs inventivos e materiais diversos nessa época) não somente pelo shape (que teoricamente teria mais a ver com uma prancha de surfe), mas também pelos materiais. Seu deck era de EVA (aquela espuma dos tapetes de ioga) revestido por uma camada de lycra estampada (!?!).

O bloco era de Arcel, e o fundo era de estireno, algo próximo do material dos copos descartáveis. Suas bordas faziam uma transição ao longo da prancha (vide imagem), começando em 90/10 no bico, ficando 50/50 no meio e chegando na rabeta com 10/90. Algo absolutamente engenhoso pra época, isso bem antes do lançamento das bordas “transitional” de Ben Severson na BZ e na BSD. Com 50 polegadas de tamanho e uma rabeta minúscula de 5.5 polegadas (as pranchas “normais” tem algo em torno de pelo menos 17″), a Pocket Rocket se comportava muito como uma prancha de surf, ganhando muita velocidade e fazendo trocas de borda muito mais rápidas e fechadas do que uma prancha normal. O seu tamanho exagerado acabava incomodando na hora de bater as pernas e se posicionar em cima da prancha, e seu design tão diferente acabou não fazendo sucesso. Preço também não ajudava ($235 dólares), já que isso era o dobro de uma Mach 7-7 e no mesmo nível de uma Ben T-10 na época.

7. Nadadeiras Flips

Essas nadadeiras poderiam ser o sonho de quem tem sempre problemas de adaptação e feridas com as nadadeiras “comuns”, feitas de borracha. Com design minimalista, ela era feita de uma barbatana de plástico e de alças que são presas por velcro ou presilhas ao longo do pé, algo que teoricamente seria extremamente confortável. Mas além da fragilidade do plástico na barbatana, não consigo imaginar alguém usando isso em alguma onda mais rápida ou extrema, como Pipeline por exemplo. Imagino que nessa época algumas pequenas empresas tentaram entrar no mercado mirando o consumidor eventual de final de semana (e seu $$$ logicamente), e esse provavelmente era o caso da Flips.

8. Pranchas Eliminater

Essa marca era bem diferente de todas as outras não pelos seus shapes ou atletas que faziam parte de seu time, e sim pelos materiais utilizados na construção das pranchas. Além do bloco de Arcel (comum na época), todo o resto da prancha era feito de vinil marítimo de 10 milímetros, algo totalmente incomum até hoje. Não sei exatamente como a prancha se comportava, mas pelas fotos dá pra ver que tinha que colocar muita parafina, já que o vinil é algo extremamente liso quando molhado. Detalhe também para as bordas 30/70, que na minha cabeça não fazem o menor sentido, provavelmente deviam fazer a prancha afundar na volta das manobras e deixar solta demais nas cavadas.

É isso, acho que deu pra ter uma ideia de como os anos 1990 foram inventivos e também como a indústria era mais descentralizada, não existia essa história atual de apenas 2 fábricas de pranchas, 3 fábricas de nadadeiras e etc… Sem a globalização em seu estágio acelerado, cada marca conseguia desenvolver suas próprias ideias e aplicá-las na sua própria fábrica, nunca dependendo da boa vontade de uma fábrica do outro lado do mundo, como funciona hoje.

Conforme eu for achando mais produtos ou características estranhas, vou atualizando esse post. Invencionices não faltam.

Vejo vocês na água!

Paulo Fleury

Test Drive: Science Tanner McDaniel LTD 42.5″

Bora pra mais um review! Algo que eu sempre sonhava em ler quando comecei a surfar, e só achava em revistas gringas. Como não amar a internet, não é mesmo?

Uma das combinações de cor mais bonitas do mercado atual, e as canaletas que pegam quase o fundo todo da prancha.

A Tanner tem sido um dos modelos da marca Science mais vendidos no mundo desde seu lançamento, em meados de 2018. Tanner McDaniel obviamente não precisa de apresentações, e sua competência e radicalidade já são mais do que conhecidas, seja em sessões de free-surf em The Wedge ou competindo nas etapas do Circuito Mundial. O menino prodígio chamou a atenção para o seu modelo de prancha vencendo nada mais do que a famosa etapa de Arica no Chile, usando uma prancha stock (de loja) tirada do plástico, do mesmo jeito que nós meros mortais. Antes disso Tanner usava sempre o modelo Launch, adaptado pro seu tamanho e com a tecnologia ISS. E as características dessa prancha seguem a linha da Launch: velocidade acima de tudo.

Onda boa é o lugar perfeito pra testes de prancha. Aqui numa bela direita no Litoral Norte de SP. Sequência: @roverimagens

A Science Tanner LTD que vocês vêem aqui foi trazida por mim do Hawaii em março, e é da linha 2019/20. Ela já conta com a chamada rabeta “TriQuad”, com quatro canaletas no fundo e o recorte nos “tail pegs”, dando a ideia de uma rabeta crescente tripla. Isso faz com que a prancha consiga andar bem na parte de cima da parede, o que ajuda muito quando você está atrasado dentro do tubo (e precisa passar sessões), e também deixa a rabeta um pouco mais solta e acima da água, ajudando nos 360 normais e invertidos. Fora isso ela conta com os contornos no deck (ajudando na pegada), tela e stringer simples de carbono. A peça de acabamento da rabeta é separada, dando mais um detalhe de estilo. Essa cor rosa do deck foi novidade quando lançada, e até hoje é meio difícil de se ver (para o Brasil por exemplo não veio, infelizmente) por um problema de falta de matéria-prima na fábrica. Hoje acho que isso se normalizou e outras marcas seguiram na onda, casos da Pride (pro model de PLC) e da Hubboards (no pro model de Jared Houston).

Boas ondas no começo do inverno aqui em SP nos primeiros testes com a Science Tanner LTD. Sequência: @rafael_nsc

No geral o desenho e o volume da prancha é algo entre os modelos Pocket e Launch, mais estreita mas ao mesmo tempo com alguma curva.  Nota-se também o bico bem pequeno e uma área maior perto da rabeta, garantindo um centro de gravidade mais baixo no geral e ótimo pra trocas de borda, cavadas rápidas e invertidos, muito como Tanner surfa normalmente.

Surfei com a Science Tanner em boas condições de onda aqui por SP (apesar de restrições de horário em relação a pandemia), seja em dias de 0,5 metro comum até um dia clássico com boas ondas tubulares. A prancha se comporta bem demais em qualquer condição, voando por “flat spots” e virando com precisão em invertidos. Em ondas bem tubulares é nítido o controle e velocidade que as canaletas te proporcionam, dando a possibilidade de andar alto na parede ou acelerar forte nas manobras. As canaletas MS já davam essa vantagem e acho que agora as Quad aperfeiçoaram isso ainda mais.

A Tanner também vai muito bem nas trocas de borda e em dias menores. Sequência: @rafael_nsc

Esse tipo de rabeta “TriQuad” ainda não está disponível no Brasil, mas esperamos que o dólar dê aquela baixada para a Science Brasil poder colocar toda essa tecnologia disponível por aqui. Os modelos vendidos aqui tem as canaletas MS, que funcionam de maneira relativamente semelhante e que já foram abordadas por mim num post sobre a Science Pro LTD.

Acabamentos perfeitos como de praxe nas pranchas Science. 

Concluindo, arrisco dizer que talvez essa seja a prancha com o maior equilíbrio que eu já vi, ela simplesmente vai embora nas marolas e não sobra em absolutamente nada nos dias com mais força. Como eu sempre digo o aspecto geral, o desenho e o comportamento das Science na água é algo que realmente se destaca, e com essa prancha não é diferente. Recomendo demais essa prancha pra quem gosta de ondas buraco, mas também tem fissura pra cair na água quando o mar não tá lá essas coisas.

Você encontra a Science Tanner aqui no Brasil em dois modelos, a SPEC e a LTD ISS. Acesse o site da Turbo Surf Shop (turbosurfshop.com) ou entre em contato com os revendedores autorizados pelo Brasil, como a Surf Trunk, Ucla Brands, Vortec, UV Store, Onix e High Score.

E agradecendo sempre aos fotógrafos que de alguma maneira contribuem para as fotos que aparecem aqui, sem eles esse blog não existiria!

Science Tanner McDaniel LTD 42.5”

Bloco: Polipropileno 1.9 lb com tela simples

Deck: Polietileno 8lb NXL

Fundo: Surlyn com Quad Channels

Stringer: Simples de carbono

Rabeta: Tri Crescent/Swallow 

Bordas: 55/45

Preço: Cerca de US$ 299 nos EUA (esse modelo exato das fotos) ou R$ 1680 na versão LTD ISS / R$ 1519 na versão SPEC, aqui no Brasil.

Prós: Desenho e comportamento versáteis demais pra uma prancha tão estreita, funciona perfeitamente na maioria das condições. Rabeta e canaletas fazem a prancha andar muito rápido e virar sempre com precisão, mesmo em ondas cheias.

Contra: Cor específica do modelo de teste pode desbotar com o tempo. O tamanho do bico talvez seja algo a se acostumar (um pouco pequeno).

Todas as Science tem desde o ano passado as medidas estampadas no fundo, algo inédito e que ajuda muito na hora de comparar modelos e acertar na escolha na hora da compra.

Tanner McDaniel no lugar mais alto do podium em Arica, no ano de 2018: prancha sem logos numa versão simples “de loja”. Foto: APB World Tour

Detalhe da rabeta crescente “tripla” e de como o bico parece um pouco pequeno. Foto: Science Bodyboards

Mike Stewart Science EZero: 20 anos de história

De volta com mais um post histórico sobre pranchas, que é o que a gente mais gosta aqui!

Ao mesmo tempo que o Blog acabou ficando mais limitado depois que comecei a trabalhar para a Science (sem reviews de outras pranchas por exemplo), eu posso por outro lado detalhar melhor coisas da história do esporte e também como a influência de Mike Stewart moldou não somente muito do esporte como um todo, mas também especificamente o mercado e seus “players”.

A Science EZero em toda a sua magnitude. 

Em 1997 Mike Stewart acabou seu contrato de forma litigiosa com a Morey Bodyboards, a antiga Morey Boogie. Depois de quase o ano todo de 1998 criando e testando um protótipo junto com o shaper Brian Peterson (um dos melhores da época), Mike lançou em janeiro de 1999 sua primeira linha própria de pranchas de Bodyboard. 

Chamadas inicialmente de “Mike Stewart Bodyboards” ou “Mike Stewart Science Works” (como já explicado aqui no Blog em detalhes), a primeira prancha a ser lançada foi a “E0”. Era uma réplica da prancha azul claro que Mike havia usado durante todo o inverno havaiano 1997-1998 (e que pode ser visto no vídeo nacional Hawaii 1998), e ganhado o seu último título do campeonato de Pipeline (o décimo primeiro de sua carreira).

Mike Stewart surfando em Backdoor com o protótipo azul claro e do lado esquerdo já a versão final da EZero colocada á venda. Imagem: Arquivo pessoal WP

Essa prancha foi um grande sucesso, por motivos óbvios e também por alguns itens que já mostravam como Mike era alguém que trabalhava em cima e sabia o valor dos detalhes. 

Mike saiu da Morey e sabia que pra bater de frente com um dos maiores fabricantes da história do esporte, ele teria que fazer algo diferenciado e com muita qualidade. O primeiro detalhe a ser decidido seria onde e por quem as suas pranchas seriam feitas (não existiam fábricas “genéricas” na época).

IMG_5228Stewart com algumas de suas pranchas na transição Morey-Science em 1997, apenas com o logo pessoal ‘MS” no deck e um minúsculo adesivo da Morey no fundo. Imagens: Grand Flavour IG / Bodyboard History IG / Arquivo Pessoal BBMag

Mike foi então atrás de alguém que já era um dos melhores shapers da época, o californiano Brian Peterson. Peterson trabalhava na fábrica da Toobs na California desde o começo dos anos 1990, e pra quem não se lembra, a Toobs foi durante muito tempo uma das principais marcas americanas. Buzz Morasca (o dono da Toobs) tinha em mãos o desenvolvimento de um dos principais processos de manufatura de uma prancha, a laminação térmica, usada até hoje da mesma maneira nas fábricas de Taiwan (Agit) e da Indonesia (Broady). Então Brian Peterson era uma pessoa mais do que gabaritada pra ser o cabeça das pranchas Science, no começo de 1999. Brian Peterson começou inclusive a fazer pranchas na mesma época que Nick Mesritz trabalhou com Buzz Morasca na Toobs.

Brian Peterson em seu projeto autoral “Vortex Bodyboards”, imediatamente depois das pranchas Science. Imagem: LinkedIn BP

Brian Peterson (à direita) junto com Tom Morey e Nick Mesritz: um nome forte para tocar a produção da Science. Imagem: NMDstox.com

O segundo detalhe seria o material das pranchas. Mike já havia trabalhado com diferentes modelos na Morey e surfado o suficiente com blocos de PE, e sabia que seu desenvolvimento estava já esgotado. Outras marcas como a BZ e a australiana Manta já tinham blocos de Polipropileno (PP), e ele sabia que isso seria definidor do sucesso das suas pranchas e o futuro para o esporte. Por ser obviamente um bloco mais leve, e com uma cavada muito boa e resistência em água quente, coisa que o PE não tinha definitivamente. Toda a linha Science inicialmente teve a combinação “matadora” (e referência até hoje) de bloco PP, pele e bordas “ásperas” de PE (chamado de NXL), fundo Surlyn e sem stringer. 

Bloco PP, deck e bordas de PE NXL, e fundo Surlyn sem canaletas, nose bulbs ou bumpers protegendo as emendas.

Mike sabia que essa combinação era incrível do ponto de vista de performance, e suas pranchas logo se tornaram referência não só nas lojas, mas também entre os próprios atletas profissionais. O bi-campeão mundial Damian King confessou há pouco tempo atrás que surfou um inverno havaiano inteiro com uma prancha Science E3, mesmo tendo patrocínio da Morey na época. Logos da Science foram apagados e o tradicional “M” da Morey foi pintado de caneta permanente no deck de uma de suas pranchas. Outros profissionais da época fizeram o mesmo na hora de encarar ondas mais extremas como Pipeline e Shark Island por exemplo. 

Uma Science E3 (lançada no ano seguinte de lançamento da E0) que foi usada pelo bicampeão mundial Damian King, com logos apagados e os patrocínios reais dele desenhados a mão.

Outro ponto seria a oferta limitada das pranchas E0. Apenas 1200 seriam fabricadas para o mundo e todas seriam numeradas a mão, uma a uma. Essa prancha que ilustra o post é a de número 707, e foi minha prancha de uso pessoal durante todo o ano de 1999, até eu comprar também uma E2 em 2000.

Pranchas produzidas em série e numeradas uma a uma, algo totalmente inédito até hoje.

Toda construção da prancha era de alto nível pra época, mas não sei ao certo o que deu errado na laminação (algo que era referência onde Brian Peterson trabalhava antes), que algumas pranchas acabaram com bolhas no deck. A minha tem uma parte “solta” perto da rabeta, e eu consegui tirar o ar com uma seringa com agulha. Já nos outros modelos lançados a partir do verão seguinte esse problema foi consertado e as pranchas se tornaram então objeto de desejo e referência no mercado americano (o maior na época).

Detalhe pro bico quase chanfrado, acompanhando o ângulo das bordas, e diferente dos acabamentos atuais.

A E0 chama a atenção hoje em dia principalmente pelo seu fundo flat sem canaletas (algo até comum pra época, mas impensável hoje), falta das proteções de Crosslink / IXL na rabeta e no bico (os chamados “tail bumpers”) e também a falta dos “nose bulbs”, que ainda não eram padrão da indústria. A EZero também não tinha tela e talvez o ineditismo e a resistência do bloco PP à epoca tenham sido definidores disso.

Shape bem alinhado e equilibrado até pros dias atuais de pranchas extremamente estreitas. Talvez o que Mike Stewart faça de melhor até hoje.

A prancha era super solta graças a rabeta, e funcionava muito bem em qualquer tipo de onda, já que tinha um desenho mais largo e alinhado ao que era comum no final da década de 1990. Junto com uma linha de acessórios (capas, leashes Gyroll e as nadadeiras Viper), Mike movimentou o mercado com suas pranchas e mostrou pro mundo que não era apenas dentro da água que sua excelência era destaque. Marcas tradicionais também criaram linhas específicas com pranchas de PP (a Morey inclusive), já pra tentar competir com os outros modelos da Science que seriam lançados logo em seguida, caso das pranchas E1 e E2.

Nesse ano de 2020 a Science começa comemorações de seus 20 anos de história, e essa prancha acaba de ser relançada nos EUA com os mesmos materiais e desenho, mas com a adição providencial de um stringer (pra garantir mais resistência). Agora é torcer pra situação atual do Brasil melhorar e pro dólar baixar, pra quem sabe ter uma EZero 2020 por aqui.

A edição comemorativa da EZero já está disponível nos EUA, com detalhes atuais (stringer e bumpers no bico e rabeta). Imagem: sciencebodyboards.net

O poster que vinha junto com a Ezero: Mike Stewart em seu auge e a dúvida ainda sobre o nome da marca (Mike Stewart Science Works).

S4 copy_1A primeira inserção da Science em uma publicação, na revista americana BBing Mag em 1998. “A maior tempestade na história do Bodyboarding vai chegar em março de 1998” .Imagem: Arquivo Pessoal

Acho que é isso, acabei escrevendo esse post depois de relembrar dessa prancha aqui em casa e pegá-la na mão, e ver como as pranchas atuais evoluíram bastante.

Agradeço sempre a quem se interessa por esse lado mais técnico do esporte e vem aqui ler meus textos. Recebo inclusive mensagens de Portugal e isso sempre me motiva a continuar escrevendo por aqui.

Todas as fotos foram tiradas por mim, a não ser que especificadas.

Vejo vocês na água! (se a quarentena deixar)

Entrevista: Jeff Urdan

E voltamos ao blog nesse novo ano, seguindo com essa série de entrevistas focadas em equipamento, e história do esporte principalmente! Nesse caso fica difícil não pensar em alguém com tanta experiência e bagagem nas costas quanto o carioca Jefferson Anute, mais conhecido nos últimos anos como Jeff Urdan.

Jeff foi desde o começo de sua carreira destaque nas competições, e ganhou fama ao conquistar o título mundial amador em 1994, no que é conhecido hoje como ISA Games. Depois disso foram anos a fio competindo o circuito mundial GOB em sua época áurea, ao lado dos principais nomes do esporte no mundo.

Jeff tem além disso 3 títulos brasileiros profissionais e 2 títulos cariocas, além de uma infinidade de fotos publicadas em revistas nacionais e gringas, modelo de prancha assinado por ele durante anos e por aí vai. Sempre imaginei que ele teria muita coisa interessante pra contar, e depois de a gente conversar a certeza foi grande. Ele sempre me recebeu super bem no RJ em todas as vezes que fui, e já dividimos alguns bons dias em São Conrado, competindo juntos inclusive. Muito obrigado Jeff pela atenção e pelo seu tempo!
•WP: Fala Jeff, tudo bem? Como você se interessou pelo esporte e qual foi exatamente seu primeiro equipamento (prancha e pé de pato), e em que ano?

Jeff Urdan: Eu fui fabricado numa barraca de camping em Grumari, meus pais não saiam da praia! Já sou acostumado com as ondas desde 5 anos, pegando espuma nas praias da Barra, Copacabana, e Cabo Frio. As férias eram sempre uma grande confraternização da família na praia.

E apesar de já acompanhar o Bodyboarding pela TV, e pegar uma prancha Sea Cat da minha prima de vez em quando, foi em Outubro de 1990 que comprei meu primeiro material bom de verdade. Foi uma Speedo MP PRO, gigante pro meu tamanho e que não durou muito tempo, porque apareceu a BZ Diamond Junior que era ideal para o meu tamanho e acabei trocando. E um par de pés de pato Redley pontudos azul e amarelo, os melhores do mundo até então. E sobre as pranchas, é bem interessante porque antigamente não existiam tamanhos menores que 42 e 43 polegadas… Imagina um moleque pré adolescente carregando umas pranchas gigantes? Era assim antigamente!

Voltando a compra da minha BZ Diamond Junior, foi a partir daí que quis me tornar igual a todos meus ídolos da TV que pegavam ondas de Bodyboard. Não comecei a competir por acaso. Eu foquei nisso! Recortava as fotos das revistas e fazia quadros e enchia de Bodyboard na parede, e ver isso todo dia me inspirava!

Isso me motivava demais pra um dia ter fotos minhas em revistas, ganhar campeonato, viajar sendo patrocinado… Era um sonho que queria que fosse real, e foi! O esporte me salvou de não ter atropelado minha infância/adolescência e ter passado direto pra fase adulta sem experiência nenhuma de vida.

A orla carioca nunca decepciona quando o assunto é onda e isso sempre foi definidor pro alto nível dos atletas. Aqui Jeff acerta a linha num belo canudo no Leme. Foto: Henrique Pinguim

•WP: Como era a variedade de marcas no mercado no começo de sua carreira, e depois como competidor e Top da GOB? Como era sua relação com o material que usava no Circuito Mundial?

Jeff Urdan: No começo, quem dominava era a BZ e a Moreyboogie, tanto no Brasil quanto lá fora. Estas duas tinham os grandes nomes do esporte, como Mike Stewart e Ben Severson.

No Brasil a BZ tinha também os principais nomes: Paulo Esteves e Xandinho, como os 2 maiores representantes. Tinha a Wave Rebel também correndo por fora, com Kainoa Mcgee lá fora e Guilherme Tâmega recém saído da Ombak, competindo no Brasil e no circuito americano. Tinha ainda a Speedo, com atletas como Marcos Cal Kung e Kiko Pacheco, e também a Fidji com Marcello Pedro, Fabio Aquino, Claudia Castello e Rodolfo Fiuza. Mas a Fidji não durou muito tempo também! Isso são lembranças boas que tenho… Essa galera toda me inspirou muito no início, quando resolvi que queria ser um campeão de Bodyboard!

Já como competidor do Circuito Mundial iniciei pela Genesis, onde tive meu primeiro modelo de pranchas e que foi muito bem aceito pelo público. Eu tinha acabado de ser campeão mundial amador, e eu era talvez a sensação do momento! Foi o modelo mais vendido da marca na época, palavras do Marcos Kung, conforme ele relata até hoje!

Ai, já com toda aquela ascensão de campeão do mundo pelo ISA games e tentando a vaga de top do circuito mundial GOB, o Gian Carlo Lioce, representante legal da BZ no Brasil, me convidou para ser atleta de uma marca que ele abriria, chamada X-PRESS.

Essa marca deu tão certo que cresceu ao ponto de termos na equipe: Mariana Nogueira, Stephanie Pettersen, Paulo Esteves, Leila Alli, Pablo Rodrigo, Gugu Barcellos, e eu! Este time fez história e rendeu uma boa parceria que durou 03 anos muito intenso!

As vendas do meu modelo eram muito boas, principalmente no Japão, onde era o carro chefe da vendas. Vendeu muito por lá, os japas se amarravam na minha! Vendeu muito bem também no Chile e na Argentina. Mas a empresa terminou em 99, e aí entrei para a Science, logo no seu começo, e na verdade foi mais um apoio do que um patrocínio mesmo. Mas tudo isso foi legal demais porque durante todo o circuito mundial eu fui testando vários materiais e shapes, ao longo das diferentes marcas. Levava todas as informações para a fábrica da BZ Brasil, onde eram produzidas as minhas pranchas X- Press por exemplo. Eu testava muita coisa: os blocos de Arcel, PP, PE, ZCore, tamanhos dos shapes, bicos, bordas, diferentes rabetas… Na época a Bat-tail era febre, mas sempre preferi a crescent tail. Ficava louco com tanta informação, mas adorava sair da fábrica com uma prancha feita sob medida pra mim e do jeito que eu queria, para poder encarar os melhores do mundo de igual para igual. Depois que parei de viajar pra competir o Tour, ainda tive apoio da marca européia 5C e também da Morey Boogie americana.

•WP: Qual foi o seu primeiro patrocínio de prancha e como funcionava (quantidade e modelos de prancha que você recebia)?

Jeff Urdan: O meu primeiro patrocínio de pranchas de verdade foi pela Genesis, quando o Kung ainda era o dono. Quando fui da Genesis oficialmente foi pela gestão e suporte do Kung!

E foi aí que tive meu primeiro modelo de pranchas, que além de ganhar um royalty bacana, tinha direito a 20 pranchas anualmente. Coisa que hoje em dia eu imagino que seja impossível de acontecer por aí, a não ser com os tops do circuito mundial.

Hoje vejo infelizmente muito atleta comprando pranchas mais baratas e enchendo o fundo de adesivos, falando que são patrocinados, quando na verdade estão sendo explorados por alguma marca que insiste em não largar o osso! Eu nunca dei mole pra empresário vampiro. Ou andamos juntos, ou não me terão na marca deles. Acho que falta muita maturidade nos atletas de hoje em dia! Não digo todos, mas a maioria não se valoriza e aceita qualquer coisa das marcas. A galera precisa entender que as marcas não estão fazendo um favor em nos patrocinar, é sim uma troca de trabalhos, uma parceria.

São Conrado é uma das melhores ondas do Brasil e Jeff é figura carimbada nos dias clássicos. Foto: Rafael Nunes

•WP: Qual foi seu melhor patrocínio e melhores pranchas que usou quando atleta e até hoje?

Jeff Urdan: Meu melhor patrocínio foi a Company em parceria com a Cyclone em termos de infraestrutura. Mas eles não tinham pranchas, era uma marca de Surfwear. Com as pranchas foi a Genesis quando o Kung era o dono, aprendi muito com o careca pai do Bodyboard brasileiro. E a BZ/Xpress que me deu todo o suporte de conhecer uma fábrica, acesso livre na produção das minhas pranchas! Mas em termos de material a Science foi a prancha que mais trabalhou comigo na evolução do meu surf! Até hoje em dia acho a Science e a NMD as melhores. Elas estão um nível acima das demais!


Voando alto com seu Pro Model pela antiga marca nacional (e ligada a BZ) X-Press e também com patrocínio da marca havaiana de roupas de borracha Xcel. Foto: Arquivo Pessoal

•WP: Como as pranchas e materiais evoluíram ao longo do tempo na sua opinião?

Jeff Urdan: Muito boa essa pergunta! Cara, a evolução foi gritante… Como já disse, do meu início para a parte onde comecei a vencer campeonatos, a evolução dos shapes e materiais foi enorme. Mas de uns dez anos pra cá o esporte cresceu absurdamente dentro d’água, e nas pranchas não foi diferente!

O Bodyboarding bacana, como penso ser a forma certa de praticar, precisa de velocidade, muita velocidade. E uma prancha bem feita precisa te dar muita projeção para construir essa velocidade!

Acho muito interessante a mistura de blocos buscando uma prancha resistente mas que responda seus comandos. Também acho a criação de stringers removíveis foda! Isso pra mim foi a parada mais sinistra! Acho incrível escolher o stringer que melhor se adequa ao tipo de mar e/ou temperatura da água. Apesar de ainda acreditar que uma prancha boa de verdade, se adapta a qualquer condição.

Eu sempre achava ruim levar muitas pranchas para as viagens por causa do peso, e sempre ficava na dúvida se tinha escolhido o shape certo. Então, resolvi mudar só o tamanho mesmo. Hoje prefiro escolher duas pranchas e só mudar o tamanho. Surfo sempre de 41 polegadas em fundo de pedra, e 41.5” ou até 41.75”/ 42” nos fundos de areia. Acho maneiro bater no lip das fechadeiras com pranchas maiores!

Acho também que a evolução hoje em dia deu uma parada, porque a maioria das marcas produz suas pranchas nas mesmas fábricas. Mudam só os nomes e o marketing feito pelas empresas! Temos a fábrica de produção de primeira linha na Indonésia, com matérias primas mais caras, e as que já fazem um trabalho mais barato na China, mas de nível um pouco inferior, mas não ruins.

•WP: Como é sua relação com os equipamentos hoje em dia? Qualquer prancha no seu tamanho te serve ou você se interessa de alguma maneira pelo shape/desenho/ materiais e coisas do gênero?

Jeff Urdan: Sempre tive uma exigência muito grande neste lance de escolha de pranchas desde moleque! E hoje isso aumentou ainda mais. Eu odeio pranchas com widepoint mais pra cima do nose, tipo gota. Nunca me adaptei e acho que este shape não é compatível com quem busca trabalhar a linha de onda focada na troca de bordas. A forma correta em minha opinião de se surfar é sempre abusando da velocidade, com “carves” e trocas de direção. E pra isso gosto mais de um desenho com curvas mais suaves e widepoint na linha do cotovelo. Mas em compensação em dias de ondas mais fechadas, acredito que um desenho mais reto e quadrado (como nas pranchas australianas), pode ser bem funcional para voltar de grandes manobras em condições pesadas.

Desde que saí da Morey Boogie estou sem patrocínio/apoio de pranchas, e isso me possibilita usar o shape e marca que quiser. E confesso, recentemente recusei entrar em algumas marcas, não só de pranchas, mas como pés de pato, porque eles não tinham o que busco para meu tipo de surf! Já deixei de evoluir porque usava pranchas que não se encaixavam no que busco, porque era patrocinado e tinha que usar só o que eles tinham, e que não era o melhor material e shape. Acho que não tem sentido ser pago por uma marca, mas usar outra porque é melhor do que a que te patrocina! Tipo apagando logos e etc… Sempre fui muito profissional nesse sentido!

Hoje, busco uma marca que tenha compatibilidade com minha linha de onda (e não seja marca vampira) para fechar alguma parceria comigo! Graças a Deus tenho meu trabalho e não preciso ficar dependendo de esmolas das marcas. Vou na loja compro a prancha que me atrai no shape, material, resistência, apago o logo da marca, e vou ser feliz. Fechar parceria comigo funciona assim: Ou é bom para ambos, ou estou fora!

Hoje surfo com o shape do Mitch Rawlins da Found, mas já quero trocar! A prancha é boa, mas não tanto para beach break. Estou procurando um shape que ande bem na areia e

na pedra… Aceito sugestões de uso das marcas atuais, é só me procurar. Sou muito na minha, não procuro as empresas por não saber fazer propostas, confesso que não sou bom em vender meu peixe. E enquanto esta marca não aparece, vou experimentando muitas pranchas!

Mike Stewart cravou já algumas vezes que Jeff tem o melhor invertido do mundo. E quem vai duvidar não é? Foto: Rafael Gomes

•WP: Como foi a experiência de fazer parte do time de Mike Stewart nos primeiros anos da Science Bodyboards?

Jeff Urdan: Cara, foi de muito aprendizado! Na verdade não fui patrocinado pela Science, fui apoiado!

O Mike me dava 2 pranchas da Science durante a temporada havaiana, e mais 2 para surfar no Brasil durante o ano. Mas o mais interessante foi o que ele me passou em conhecimento! Não é todo dia que a lenda MS senta no canal e fica te observando surfar. Íamos treinar de manhã e ele ficava vendo o que eu tinha que melhorar, e a tarde combinávamos de nos encontrarmos em sua casa e trocávamos ideia sobre linha de onda, fluidez, técnicas, e estilo!

Sempre procurei fazer bodyboard preocupado com estilo e após essa experiência com a Science e o Mike, só aumentou esse foco, que tenho até hoje na lapidação eterna da linha de onda e estilo! E isso só vai parar quando eu for para outro plano!

Sem dúvidas ter aprendido muita coisa com Mike Stewart e Guilherme Tâmega (que também me apoiou com suas pranchas da Wave Rebel quando eu ainda era amador) no início, me ajudou na construção da linha de onda que tenho hoje! Gosto da mistura entre o muito radical e o muito fluído, e isso tirei do surf dos dois, ao lado de Ryan Hardy e Spencer Skipper, minhas únicas 4 inspirações no nosso esporte!

Aquela segurada precisa só com a ponta dos pés de pato, e a postura perfeita. Foto: Arquivo pessoal

•WP: Como você enxerga o mercado atual e o futuro do esporte no Brasil?

Jeff Urdan: Acredito que a vida tem seus altos e baixos, como tudo na vida. E no Bodyboarding não foi diferente! Já tivemos grandes marcas de fora do esporte envolvidas, como Gatorade, Kibon, Cashmere Bouquet, Tampax. Mas nos dias atuais são raríssimas as competições que tem multi-nacionais como patrocinadores. E isso é muito importante para o crescimento do esporte, trazer para nossa tribo empresas grandes e não especializadas.

Mas de certa forma, isso também tem um lado positivo. Porque faz com que pessoas do nosso meio abram empresas envolvidas somente com o nosso esporte, e torço para que isso apareça cada vez mais! Mas falo daqueles que realmente querem fazer algo pelo Bodyboard. Nosso esporte é incrível, não tem como não vender! Na orla da zona sul carioca por exemplo, tem muito mais bodyboarders do que surfistas!

Na parte competitiva, felizmente a gestão nova da Cbrasb vem fazendo um bom trabalho e está mudando um cenário ruim deixado por gestões passadas. Tive a oportunidade de disputar o título brasileiro master 2019, e pude ver de perto o tanto que esta nova equipe da confederação está profissional! Sem brigas de egos, e todos em prol do crescimento do esporte. Claro que algumas coisas podem melhorar, mas o caminho que eles estão traçando está certo!

O futuro é este: Depender cada vez menos de verba pública e com mais multi-nacionais envolvidas! Acredito que vender o Bodyboarding como ele tem que ser visto também é muito importante!

A variedade de ondas no Rio é algo fora da curva. Aqui Jeff em uma das melhores fotos já vistas no famoso Shorebreak de Copacabana. Foto: Henrique Pinguim

•WP:Como você acha que o esporte mudou sua vida de alguma maneira e te fez ser a pessoa que é hoje?

Jeff Urdan: Tudo que sou agradeço ao suporte da minha família por ter acreditado e terem me ajudado ao sonho de ter participado do World Tour! Sou de família simples mas muito unida, e que me apoiou com o que puderam para este feito!

Apesar de continuar com vida de atleta, acordando de madrugada todos os dias na semana para surfar quando tem ondas boas, malhando, cuidando do sono e da alimentação, hoje não participo do mundial e não tenho mais o Bodyboard como trabalho. Mas serei bodyboarder profissional até quando Deus permitir!

Não precisa estar no circuito mundial e ter adesivos na prancha para isso, basta surfar todos os dias em alta performance, e levar a sério o que você faz nas ondas! Eu afirmo para todos que o Bodyboarding não é só um esporte e um estilo de vida pra mim, é muito mais do que isso. É vital!

E foi o Bodyboard que me fez ser quem sou hoje como pessoa, e como profissional. Viajei o mundo, aprendi falar outras línguas e isso me ajudou muito no trabalho que tenho. Sou da área de hotelaria há 09 anos e foi o inglês que me fez passar na minha primeira entrevista. Se não fosse o esporte eu não teria viajado e aprendido nenhuma língua estrangeira.

Aprendi também a ser uma pessoa mais disciplinada, e mesmo acreditando que o equilíbrio é o segredo da vida boa, de certa forma o cara que viveu toda sua vida competindo acaba sendo mais focado. O atleta aprende a ser ético, não perde tempo com coisas que não agregam porque isso tira o foco. O atleta aprende a ser mais profissional em tudo que faz, aprende que a competição não é ego, é pessoal! E isso levando para o trabalho faz com que sejamos mais vistos de forma positiva pelas empresas. O atleta trabalha com metas, e metas são fundamentais na vida profissional.

O Bodyboard me tira de caminhos errôneos pelo simples fato de ter a consciência que preciso ter o corpo e mente saudáveis para poder surfar em alta performance e que é obrigação se cuidar! Se percebo que as coisas não estão bem, pego minha prancha e vou pra água! Todas as vezes que cometi meus piores erros na vida foi porque estava afastado das ondas. Aprendi que amo o bodyboard e que este esporte me guia, me tira das portas do mal caminho!

Esporte é vida… Tenho um sonho que o Brasil acredite nisso de verdade e que possamos ter mais apoios aos esportes pelo país.

 

-X-

 

Agradeço mais uma vez a todos que de alguma forma contribuem pra que esse blog exista, e obrigado Jeff Urdan pelo tempo e disponibilidade de sempre!

Feliz ano novo e vejo vocês na água!

Science Style e Science Pro LTD: quiver completo com apenas duas pranchas

Bora pra mais um texto por aqui, hoje um breve mini-review de pranchas.

No final de 2018 eu completei 1 ano trabalhando diretamente com a Science Brasil, e resolvi hoje falar um pouco das 2 pranchas que usei praticamente o tempo todo nos últimos 3 ou 4 anos.

Science Style Loaded 42.5″: Shape já conhecido e testado a exaustão pelas mãos de Mike Stewart

A primeira nas fotos é uma Style Loaded 42.5” que eu comprei em 2015, bloco NRG 1.4lb com tela dupla e um volume de borda a mais que faz ela funcionar em qualquer tipo de onda. É a prancha que eu fiz o review aqui no blog e surpreendentemente ela continua firme e forte, sem dobras. Destaque também pros acabamentos perfeitos da fábrica do Mez, que garantem a colagem perfeita das peças extras na rabeta e no bico.

Essa prancha me acompanhou em todas as últimas viagens e também durante todo o Circuito Paulista de 2017, onde a gente sabe bem que as condições de onda nunca são as ideais. Ela funciona de 1 a 10 pés, sem o menor exagero. Se você quer ter uma prancha apenas, eu não canso de sugerir essa compra. Fora aquela certeza de estar usando o equipamento certo, afinal o próprio Mike Stewart usa a Style em toda e qualquer condição. Único defeito talvez seja dela na época ainda não ter as canaletas MS, que tiram um peso da rabeta e ajudam demais nas trocas de borda.

Pro LTD ISS 42.5″: Aquele desenho estreito que vem se tornando popular de uns anos pra cá.

A outra prancha é uma Pro LTD ISS 42.5”, que eu recebi da Science Brasil no final de 2017. É uma prancha super específica, sem tela, super fina e estreita. É o modelo do australiano Tom Rigby, que acabou saindo da Science mas imagino que pela boa aceitação desse tipo de prancha hoje em dia, deixaram essa prancha na linha. Com a vantagem do sistema ISS e das canaletas MS, essa prancha acaba tendo uma versatilidade incrível mesmo com toda a especificidade que eu já falei. Em ondas rápidas ela simplesmente voa, faz aquele drop atrasado/scoop como nenhuma outra, mas em dias menores ela surpreende e também anda.

Apesar da largura e do volume a mais (bordas e bloco mais grosso), a Style Loaded anda demais em qualquer condição. Foto: Rodrigo Nattan

Nos dias menores eu acabo usando um stringer mais duro de carbono, e a prancha anda super bem também. Ponto pro Mike mais uma vez, que consegue fazer uma prancha específica desse jeito andar também razoavelmente em qualquer condição. Como eu falei antes ela conta com as canaletas MS e isso faz toda a diferença, a rabeta não afunda tanto nas partes mais fracas da onda e no fim você consegue surfar mesmo naqueles dias de onda mais cheia ou fraca.


Detalhe das canaletas MS no modelo Pro LTD. 

Hoje em dia fala-se muito em tecnologia, em fundos com concave, rabetas diferentes, blocos híbridos como PFS, QuadCore e etc… Mas nada disso funciona se o desenho e o volume final da prancha não forem desenvolvidos o suficiente. E hoje ninguém sabe mais sobre isso do que Mike Stewart. Todos os shapes são estudados e desenvolvidos há mais de 25, 30 anos. Mike já trabalhava em seus modelos muito antes da Science existir, e isso você percebe por exemplo trocando de uma prancha pra outra sem adaptação ou dificuldade alguma, ou conseguindo surfar em qualquer condição com pranchas bem específicas, como eu falei do modelo Pro acima. Posso dizer que com esses dois modelos você talvez consiga surfar qualquer onda no mundo, de beach breaks sem muita força, reef breaks na Indonesia até Teahupo’o e Pipeline em condições de gente grande.

Em ondas muito rápidas e que precisem de uma cavada curta (como Pauba, Itacoatiara ou slabs/fundos de pedra) a Pro cai como uma luva, pra todo o resto eu garanto que você não vai querer usar nada que não seja uma Style Loaded.

Style Loaded garante aquela segurança e velocidade em ondas grandes como Teahupo’o. 

Hoje tenho certeza de utilizar os melhores equipamentos possíveis, e sei que minha performance na água está diretamente relacionada a isso. Lógico que a prancha X ou Y não faz milagre, mas você nunca vai conseguir chegar no seu máximo ou perto dele, utilizando equipamento ruim ou pra condição errada. Fica aí a dica na hora de comprar sua próxima prancha. 

O sistema ISS pode dar uma versatilidade a mais e ser o definidor naquela queda de condições específicas.

Pra quem ficou curioso, dá uma olhada lá no perfil da Science Brasil, tem o link pra loja online e muito conteúdo legal sobre todo o time Science aqui no Brasil e no mundo.

Até a próxima, te vejo na água!

Busca eterna

Hoje reproduzo aqui um pequeno texto que escrevi lá no meu instagram (@pfleury), sobre essa busca eterna por ondas e a falta de sossego que vem sempre junto com isso. 🙂

“Outro dia surgiu o assunto e fiquei conversando durante um bom tempo com um grande amigo sobre essa nossa busca incessante pelas ondas e por tudo o que orbita em volta disso. Principalmente no tanto que isso acaba nos atrapalhando e nos desgastando.

No meu caso foi uma vida toda quase, marcada por longas noites acompanhando e estudando gráficos de ondulação, vento, período, pesquisando pra ver em que direção exata as ondas e o vento entram em tal praia, ligando pra alguém tarde da noite pra ter aquela segunda opinião sobre o swell, dirigindo horas de madrugada pra muitas vezes quebrar a cara com condições ruins, desmarcando compromissos com namorada, família e amigos ou encarando aquela viagem de avião de mais de 24 horas atrás de tal onda, enfim… Vivi quase 40 anos a mais de 100km da praia mais próxima, sendo 2/3 desse tempo nessa cansativa mas muito recompensadora rotina. E certamente não me arrependo.

Invejo sim os grandes amigos nadadores que também fiz nessa vida, por precisarem de apenas uma piscina para serem felizes. Ou também aquele skatista que no começo da semana já planeja pro sábado o rolê de skate com os amigos, ou o corredor que amarra o tênis e sai correndo no meio da rua, na frente de casa. Mas eles com certeza não entenderiam o porquê de alguém acordar as 4 horas da manhã no inverno, pra dirigir 500km ida e volta, colocar uma roupa de borracha molhada e entrar num mar enorme as 6 da manhã, muitas vezes sozinho.

Esse esporte me trouxe talvez as pessoas e as amizades mais genuínas e sinceras que fiz até hoje, e definitivamente os momentos mais felizes, seja no contato mais nobre com a natureza até a valorização das coisas mais gratificantes e simples dessa vida, muitas delas que dinheiro algum no mundo compra.

E isso definitivamente me basta.”

 

Entrevista: Adílson “Chumbinho” Jr.

Mais um post nesse final de ano e hoje inaugurando uma nova sessão desse Blog, que começou sem a menor pretensão lá no começo de 2014. 🙂

Hoje vou falar de um nome que é lenda viva da história do Bodyboarding brasileiro. Não só por tudo que fez no esporte, mas também pelo coração e carisma enormes.

Eu comecei a pegar onda de Bodyboard no verão de 1991/1992, e lembro bem que Adílson Junior, mais conhecido como “Chumbinho”, era figurinha carimbada em qualquer evento ou competição no estado e no país. Fotos de sua performance precisa eram comuns em revistas da época e Chumbinho ganhou fama rapidamente como o melhor atleta amador do Brasil, e um dos poucos a conseguir ganhar do maior nome do nosso esporte, o carioca multi-campeão Guilherme Tâmega. 

Até hoje se comenta sobre uma final na Praia das Pitangueiras no Guarujá onde Chumbinho fez duas notas 10 e deixou GT em situação mais do que complicada, ganhando consequentemente o campeonato. Definitivamente um feito para poucos.

Minha história pessoal com competição é bem atípica, já que comecei a competir não tão novo, com 21 anos. Sempre ficava muito nervoso nas baterias e até hoje acho que meu estilo/linha de onda não me favorecem muito em campeonatos, então pra mim sempre foi mais um desafio pessoal mesmo do que qualquer outra coisa. Mesmo assim consegui competir o Circuito Mundial Profissional em 2000, chegando ao evento principal em etapas como Rio e Pipeline, e isso pra mim foi um feito pessoal histórico.Sempre acompanhei o cenário e continuei competindo o Circuito Paulista depois disso, e em um campeonato na Praia do Tombo já em 2009 ou 2010 tive contato finalmente com Chumbinho, que tentava reorganizar a Federação Paulista por aqui com uma enorme boa vontade.

Chumbinho ainda é nome fácil no outside nos melhores dias, sempre desfilando muita calma e técnica. Foto: Surf Salada

A primeira impressão nesse contato foi a melhor possível, Adílson é um cara super acessível e muito, mas muito gente fina. Chumbinho estava voltando a surfar depois de um tempo parado e depois disso viramos amigos, de sempre se encontrar em Pauba e dividir o outside, coisa que eu nunca imaginei nem no meu melhor sonho. Logo as conversas sobre temporada havaiana, Pauba sem ninguém no começo dos anos 1990 e a tal bateria histórica com GT se tornaram comuns, pra meu delírio obviamente. Era parte da história áurea do Bodyboarding nacional, ali ao vivo e a cores na minha frente. Chumbinho é aquele tipo de pessoa que se você sentar no bar fica horas escutando ele falar, tranquilamente. Falando sobre Bodyboarding então, a conversa vai longe.

Então a ideia dessa entrevista não é recente, já tem algum tempo mas só agora se tornou finalmente realidade. Agradeço desde já ao grande Chumbinho por toda a disponibilidade e paciência de sempre.

• WP: Chumbinho, primeiramente como você se interessou pelo esporte e qual foi exatamente seu primeiro equipamento (prancha e pé de pato), e em que ano?

Chumbinho: Em 1987 vi uma amiga com uma prancha Morey Boogie Mach 7-7. Eu já vivia na praia, muitas vezes brincando com prancha de isopor, aí no Natal minha mãe me deu uma Mach 7-7 com deck azul e fundo amarelo. O pé de pato era uma nadadeira Cobra spinta e depois já comecei a usar o Redley tradicional que dominava as praias do Brasil.

 • WP: Como era a variedade de marcas no mercado na sua época de competidor e qual o tamanho do domínio da Morey Boogie na época? Existia uma rixa entre atletas pelas marcas utilizadas (BZ x Morey Boogie por exemplo)?

Chumbinho: Basicamente o mercado era dominado por Morey Boogie e BZ, depois vieram Speedo, Genesis, Maikai e algumas outras. Rixa entre as marcas não existia, mas sim um certo bairrismo entre os estados e sobre a hegemonia competitiva no esporte.

Aquele pódium com Guilherme Tâmega em segundo lugar é coisa para poucos nesse mundo. Foto: Arquivo Pessoal Adílson Jr.

• WP: Qual foi o seu primeiro patrocínio de prancha e como funcionava (quantidade e modelos de prancha que você recebia)?

Chumbinho: Meu primeiro contrato foi com a Morey Boogie no final de 1988, e 1989 durante o ano todo. Eu era atleta amador mas eles davam todo o suporte (passagens, hospedagem, alimentação e inscrições nos campeonatos) para competir o Circuito Estadual e o Circuito Brasileiro. Nesse ano fui Vice-campeão Brasileiro Amador. Eu sempre usava a Mach 7-7 tradicional, era o carro chefe da marca e até hoje uma das pranchas mais vendidas da história, senão a mais vendida. Mas testei alguns outros modelos entre eles a 7-SS. Quanto a quantidade de pranchas, eram 4 pranchas a cada 3 meses, num total de 16 pranchas no ano.

• WP: Qual foi seu melhor patrocínio e melhores pranchas que usou quando atleta e até hoje?

Chumbinho: É difícil dizer qual o melhor, mas naquela época tive bons patrocinadores que davam suporte total para os eventos alguns até ajuda de custo mensal para um atleta que era amador, algo impensável hoje em dia até para os profissionais. As pranchas da Morey Boogie eram realmente muito boas, não por acaso dominaram o mercado por tanto tempo.
Mas tiveram outras também: Tive patrocínio da Maikai, fui Campeão Brasileiro surfando pra eles e tínhamos a liberdade de ir até a fábrica desenvolver o shape e qualquer outro detalhe. Guilherme Tâmega tinha patrocínio da Ombak e fazia o mesmo trabalho de desenvolver as pranchas.

Meu último evento como profissional foi a etapa do Mundial no Guarujá em 1995 e nessa época eu usava uma Wave Rebel, que ficou muito conhecida nas mãos novamente do Guilherme.
Após essa era competitiva fiquei 5 anos sem cair na água, retornei usando uma Turbo IV e hoje uso as GT Boards, tenho uma Mega-T 42.5″ Crescent Tail e uma Flash 42.5″ Bat-Tail. Mas estou no aguardo para testar a Science Style Loaded 42.5″ que você usa e tanto fala!

Estilo e técnica impecáveis até hoje. Foto: Surf Salada

• WP: Como as pranchas e materiais evoluíram ao longo do tempo na sua opinião? Como era surfar Pipeline por exemplo com pranchas tão moles comparadas com as de hoje?

Chumbinho: A evolução dos materiais foi gigante, não tem nem como comparar. Olho algumas pranchas hoje em comparação com as que eu usei no começo e a diferença do material, construção e acabamento é enorme. Hoje tem diferentes blocos, telas, stringers removíveis que você troca e tudo mais. É outro mundo praticamente.
Quanto a surfar com pranchas moles, eram os materiais que haviam na época (PE sempre), a grande diferença era mais nas pranchas de Arcel que a BZ tinha (algo mais parecido com o PP de hoje em dia), o restante basicamente era muito parecido.

• WP: Como era e como é sua relação com os equipamentos? Qualquer prancha no seu tamanho te serve ou você se interessa de alguma maneira pelo shape/desenho/materiais e coisas do gênero?

Chumbinho: No começo a minha primeira prancha era gigante, eu mesmo não tinha conhecimento nenhum. Medíamos a prancha pela altura do umbigo (a minha na época chegava quase no peito). O próprio mercado não tinha variedade de tamanhos, a maioria das pranchas era 42 ou até 43.
Depois com um pouco mais de experiência isso foi melhorando, mas na Morey Boogie eu usava as pranchas de fábrica normais, iguais as vendidas nas lojas mesmo.
Depois tive outros patrocinadores e pude usar pranchas específicas. Teve uma passagem interessante em que eu e o Guilherme éramos atletas da Ombak, e ele já usava as pranchas com o shape/desenho da atual GT Flash. Ele fez uma para ele e uma maior para mim. Testei um dia antes do evento mas reclamei, não me adaptei de cara. Durante o evento fui me encaixando com a prancha, que virou aquela prancha mágica! No fim fizemos a final do Estadual, eu contra ele naquela bateria histórica com as maiores médias até hoje do Circuito Paulista Profissional.

Com Guilherme Tâmega, uma grande amizade até hoje. Foto: Arquivo pessoal Adílson Jr.

• WP: Tem uma história do Guilherme pegar uma prancha do palanque pra você no Mundial de Pipeline em 1991, pode contar essa história?

Chumbinho: Na época era obrigatório os atletas usarem pranchas Morey Boogie no Mundial, que acontecia em etapa única. O Guilherme estava treinando e competindo com elas e o caddie (atleta que entrava junto caso o titular tivesse algum problema com o equipamento) entrava com o material sobressalente, ele havia me prometido a prancha caso ele fosse para a final, só que a prancha dele estava toda destruída. Aí no final do evento ele apenas trocou por uma um pouco mais nova. 🙂

• WP: Como foi essa experiência de trabalhar de Caddie pro Guilherme no mundial de Pipeline com ondas enormes em 1991? (Talvez o maior mar em Mundiais tirando o de 1994)

Chumbinho: Foi muito maneiro! Ter a oportunidade de entrar na água várias vezes e entre uma bateria e outra ainda dava a sorte de surfar uma onda em Pipeline sem crowd, coisa de sonho mesmo.
Mas fui caddie também de alguns outros brasileiros no evento, e a fissura de estar na água era muita mesmo com o mar daquele tamanho.

Chumbinho e Pauba, uma combinação perfeita já de muitos anos. Foto: Fabrício Alabarce

• WP: Como você enxerga o mercado atual e o futuro do esporte no Brasil?

Chumbinho: Vejo lojas físicas muito legais, com equipamentos excelentes nos principais estados, temos a Surf Trunk em SP, Vortec no RJ, a High Score no Ceará, fora as lojas virtuais. Todos os materiais de ponta disponíveis e uma grande diversidade de pranchas na água, isso é muito bom pro mercado, todo mundo ganha com mais opções disponíveis. E olha que esse nosso dólar não ajuda né?

Acho que o futuro do esporte passa obrigatoriamente pelo cenário competitivo, e a Cbrasb vem fazendo um belo trabalho a nível nacional. Um circuito sólido como o que aconteceu esse ano, e temos também o Mundial em Itacoatiara que já faz parte do circuito APB há anos. Quanto aos estaduais, em São Paulo o ano de 2018 foi um ano atípico devido a alguns problemas de bastidores, mas para 2019 temos uma boa perspectiva de volta das atividades. (Chumbinho é hoje presidente da Febbesp)

• WP: Pra finalizar, o quanto esse esporte definiu quem você é hoje? Qual a importância geral do Bodyboarding na sua vida, na sua história?

Chumbinho: Sou de uma família humilde e com o esporte conheci muitas pessoas, lugares e culturas diferentes. Viajei quase o litoral brasileiro inteiro e para o exterior fazendo o que mais gostava, sendo pago pra isso. Isso definitivamente ajudou bastante no meu desenvolvimento como pessoa.

E após parar de competir e ficar longe do esporte por alguns anos retornei como organizador de eventos e vejo que até hoje sou muito respeitado e isso é muito gratificante.

-X-

Foto: Surf Salada

Quero agradecer aqui mais uma vez o tempo e a paciência disponibilizados pelo Chumbinho, posts como esse engrandecem demais esse Blog e como eu escrevi antes nunca nem imaginei um dia fazer algo dessa importância.

Um ótimo final de ano pra todos que prestigiam esse Blog, vejo vocês na água!

 

Teahupoo, Tahiti: medo e desejo

Tava devendo um texto dessa viagem, esse ano foi bem corrido e confuso pra mim, 1000 coisas acontecendo ao mesmo tempo e não tava com saco de escrever mesmo. Mas agora foi e acho que esse pequeno relato é bem interessante.

No meio desse ano (Junho/Julho) eu realizei talvez o meu maior e mais tenso sonho, que era surfar Teahupoo, no Tahiti. Recrutei dois amigos mega alucinados e em dezembro de 2017 eu, Abner Scopetta e Alex Detter compramos as passagens.

Descendo aquela ladeira no chamado ‘West Bowl” de Teahupoo. Foto: 1800jakespeaking

Eu já tinha ido pro Hawaii quando era mais novo, na temporada 2000/2001, surfei Pipeline muitas vezes durante 2 meses junto de mestres como Paulo Barcellos, Hermano Castro e Guilherme Tâmega, e competi o Mundial por lá inclusive, mas Teahupoo sempre ficou na minha cabeça, sempre com esse sentimento duplo de medo e desejo. Muita gente já havia me falado que a onda não tinha tanto segredo assim, que era “só tentar remar do lugar certo”, mas fiquei praticamente 4 ou 5 meses antes da viagem vendo 1000 vídeos e passando um nervoso enorme imaginando como seria.

Alex Detter também botou pra baixo, ganhando o respeito dos locais.

É definitivamente a onda mais perigosa do mundo, todo o lineup é tenso, a remada da praia até o reef, os barcos no canal, o crowd apenas de gente mega conceituada e de locais completamente insanos e destemidos. Cada onda e cada série sobe de um jeito e numa parte diferente do reef, então é impossível prever qualquer coisa quando a onda vem na sua direção. Confesso que nas primeiras quedas me senti um ET, sem saber onde ficar ou sentar e questionando mesmo se tinha feito o certo de ir até lá. Nessas horas humildade é essencial, é uma questão de sobrevivência e de você não fazer uma besteira e colocar pelo ralo uma viagem que foi planejada com tanta antecedência e expectativa.

Aquele tubo que faz esquecer o quão perigoso é esse lugar. Foto: 1800jakespeaking

Vou contar aqui o caso que mais me marcou em relação a onda mesmo, de como a gente tem que estar preparado física e psicologicamente sempre, e de que somos meros coadjuvantes nessas horas. Fiz uma forte preparação física especialmente pra essa viagem desde fevereiro desse ano, isso é o item número 1 pra quem pretende algum dia encarar Teahupoo, e mesmo assim no fim a gente acaba passando algum apuro.

Num dia comum pra lá, com ondas de 6 a 8 pés, (Teahupoo pode quebrar até com 15-20 pés de face como todo mundo sabe) eu caí cedo e fiquei surfando meio impaciente no meio do crowd, e depois esperei a galera sair pra almoçar e ver se sobrava alguma boa (mesma tática que eu sempre fazia em Pipe). Já batia uma brisa meio maral/ladal que tava atrapalhando um pouco, mas como tinha pouca gente valia a pena ficar. Mesmo com aquela textura de vento a onda segura e dá pra pegar uns tubos.

No fim eu consegui pegar uma muito boa na frente do bodyboarder local mega casca grossa Alvino Tupuai, uma daquelas que já baforam no meio do drop, e que você meio que não enxerga muita coisa, só dá pra colocar no trilho e rezar pra sair no canal. Se você remar no lugar certo muitas vezes isso acontece e é só alegria.

Mas depois dessa veio uma daquelas séries que vem por cima do horizonte (lá você não vê a série vindo na maioria das vezes, galera dos barcos que consegue ver e assobia), e eu fui pego meio desprevenido um pouco mais pra baixo do que o pessoal que ainda estava no mar, e a experiência não foi definitivamente das melhores. Eu e um outro bodyboarder de Aruba, tomamos 4 ou 5 ondas de 8 pés na cabeça, naquela região onde a água chupa e parece que “abriram o ralo”, super comum em qualquer vídeo sobre essa onda.

Abner Scoppetta botando pra baixo naquele mar já com um vento bem de lado. Foto: Armando Goedgedrag

A primeira onda quebrou na minha frente e eu ainda consegui furar dando um joelhinho, mas na mesma hora toda a força do mar arrancou a prancha das minhas mãos e eu simplesmente virei passageiro de uma viagem um tanto turbulenta. Fui jogado e arremessado pra cima e pra baixo, e fiquei tentando não gastar o ar e manter a calma. Sabe aquela história de “você não sabe onde é pra cima e onde é pra baixo”? Sim, ela existe e é mais que real. Embaixo d’água a primeira coisa que me veio a cabeça foi que se o meu leash/cordinha estourasse eu estaria na pior condição possível, inclusive pra sair do mar. Lá em Teahupoo a onda quebra a uns 20 minutos de remada da praia, e na hora de sair você ainda rema contra uma corrente super forte, é um desafio físico mesmo. Sem prancha eu estaria em péssimos lençóis. Foram momentos de tensão e entre uma onda e outra só dava pra subir, puxar ar e afundar de novo, rezando por uma calmaria. Ter um bom controle mental ajuda demais nessas horas, se desesperar só vai te atrapalhar, seu batimento cardíaco vai subir e você vai consumir ainda mais oxigênio do pouco de ar que sobra nos pulmões. Difícil imaginar alguma calma nesse momento, mas isso é fundamental.

O que sobrou do leash Gyroll e da minha Science Pocket LTD depois de 5 ondas médias de Teahupoo na cabeça: confiança nos equipamentos é essencial. 

E aí eu bato numa tecla importante e que é o motivo de existência desse Blog. Nessas horas a gente tem que estar com os melhores equipamentos possíveis, a Natureza é completamente imprevisível seja aqui no Brasil ou em qualquer onda ao redor do mundo. E um leash de boa qualidade pode fazer a diferença entre tomar “apenas” a série na cabeça ou perder a prancha e ter que pedir ajuda pra alguém na zona de impacto da onda mais perigosa do mundo. Desde o ano passado eu conto com o suporte da Science Bodyboards e de seus acessórios aqui no Brasil, e graças a Deus meu leash Gyroll aguentou firme e forte, perdeu sim a forma, esticou e ficou todo liso (vide foto). Mas não estourou, e quando a série passou minha prancha estava do meu lado. Foi “só” remar esbaforido pro canal e agradecer por não ter batido no fundo ou ficado sem ar e apagado. Ufa!

Nos dias menores quebram ondas com a mesma perfeição e perigo, em cima de uma bancada bem afiada. 

Sim, isso é real. Teahupoo é um lugar onde você realmente se sente em cima de uma corda bamba equilibrando a sua vida junto de tanta adrenalina, crowd, água salgada e baforadas. Não existe um momento em que a possibilidade de dar um problema grave não passe pela sua cabeça. E resolver isso com calma é definitivamente pra poucos. 😉

No fim o maior problema além da onda mesmo talvez seja o crowd, a onda já é suficientemente perigosa e você ainda tem que lidar com dezenas de surfistas e bodyboarders super técnicos e que não estão ali pra brincadeira. Como em Pipeline existe uma hierarquia na fila e o clima dentro d’água está longe de ser amistoso. Haja paciência.

Por hoje é isso, já estava ensaiando esse texto sobre a viagem e espero escrever mais em 2019, esse ano teve pouca coisa aqui no Blog e isso realmente me incomoda, foram 3 posts só. Vamos ver se até a virada do ano sai mais alguma coisa.

Vejo vocês na água, abraço!

Test Drive: GT Boards Mega-T 42.5″

Finalmente esse review por aqui depois de mais de 6 meses, com um final de ano sem ondas praticamente. Estou devendo mais posts também, mas me encontro sem muito tempo graças a outros detalhes que explicarei mais pro final do post.

Recebi essa prancha graças a Abner Scopetta, atleta da GT Boards e representante da marca aqui no Estado de São Paulo. Já havíamos conversado antes sobre essa possibilidade e quando a linha 2018 chegou aqui no Brasil ele me falou que essa Mega-T 42.5” preta a minha disposição.

De lá pra cá as possibilidades de colocar essa prancha na água foram bem escassas. De outubro em diante quase não teve onda aos finais de semana aqui em SP, e eu tenho essa limitação já que moro em São Paulo/Capital.

Um dos poucos dias em que eu consegui colocar a prancha na água e pegar condições razoavelmente boas. Foto: Rodrigo Nattan

A GT Boards é uma das mais recentes marcas no mercado, e todos os seus modelos são fabricados em Taiwan na fábrica AGIT (a mesma das pranchas Found, Nomad, Funkshen, CustomX Australia e No.6). A GT Boards tem em seu time de atletas além da lenda Guilherme Tâmega, nomes fortes do cenário competitivo como Uri Valadão e Sócrates Santana, o que justifica um pouco a performance da prancha como descreverei a seguir.

Mas vamos às primeiras impressões então, de primeira achei a prancha bem acabada. No geral a fábrica Agit tem melhorado bastante a construção das pranchas ao longo destes anos, isso é nítido. Bordas e emendas são bem finalizadas diminuindo assim a possibilidade de qualquer infiltração. Me incomodou apenas não ver no encarte nada falando sobre as medidas, como sou curioso quanto a isso procurei na internet e também não encontrei nenhuma informação dessa opção de tamanho. Acho isso importante já que essa referência é essencial na hora de se escolher a próxima prancha, pelo menos pra mim sempre foi. Comparar as medidas de uma prancha que você gosta/gostou muito é ponto-chave na compra da próxima.

Outro detalhe é referente aos logos estampados na prancha, depois de duas ou três quedas o da rabeta já estava saindo. Hoje utiliza-se o método de silk-screen pra estampar esses logos, e nesse caso isso precisa ser melhorado.

A prancha agrada bastante no aspecto geral e segurando ela na mão achei apenas um pouco grossa, perto da tendência atual de pranchas mais finas e com menor volume. Mas isso é perfeitamente compreensível já que é a prancha que o próprio Guilherme usa normalmente (lembrando que a Science Style que Mike Stewart usa também é 1mm mais grossa que o comum).

Mais um dia de pequenas mas boas ondas aqui em SP. Foto: Rodrigo Nattan

Quanto ao shape, que a própria GT Boards anuncia como sendo um “australian shape”, é sim um pouco mais reto e mais de acordo com o que a gente tem visto em outras marcas, australianas ou não. Não tem mais aquela sensação de wide point tão mais alto, com o desenho sendo quase uma “gota” invertida. Mas dá sim pra perceber um caimento em direção à rabeta. Guilherme acertou bem nisso já que deu uma boa modernizada na prancha, mas não tirou aquela característica clássica de um outline com a rabeta um pouco menor. Com essa medida na rabeta, a Mega-T gira super bem nos dias menores, sempre com bastante controle graças a área perto do bico. Olhando de relance me pareceu um pouco com o desenho das NMD Ben Player, obviamente com os ajustes de outline do wide point e rabeta.

Destaque pros contornos no deck, que são muito bonitos mas em um momento me pareceram não tão funcionais, principalmente nas laterais e onde a mão vai segurando a borda. Exatamente onde eu seguro a borda (e onde a maioria das pessoas também) o contorno desvia pra parte de dentro do deck, perdendo sua função. Na foto mais pro final do post dá pra entender melhor o que eu estou dizendo. Pessoalmente eu prefiro decks sem contornos ou com no máximo os rebaixos retos onde se segura a prancha (pegada simples no bico e nas bordas como na Science Launch por exemplo).

Surfei com a Mega-T em dias menores com ondas em torno de 0,5 metro, e também em um dia de boas ondas com 1 metro e algumas maiores. No dia maior a Mega-T me pareceu um pouco dura, mas imagino por ser uma prancha ainda nova e pouco amaciada. Isso é garantia de uma boa sobrevida e durabilidade ao longo do tempo. Eu pessoalmente acabei acostumando com pranchas já um pouco mais moles desde novas, como é o caso da Science Style ou outras pranchas um pouco mais finas. Mas isso é questão de gosto pessoal, então fica aqui apenas a constatação pra quem de repente for comprar “as escuras” pela internet. E sei bem que tem gente que gosta de prancha mais dura no geral, então fica aqui o relato.

Fica nítido então que a Mega-T foi feita pra manobrar bastante e aguentar as pancadas, já que a prancha parece ser bem robusta com seu bloco de PP, stringer e tela. As cavadas e as trocas de borda são rápidas (graças à área menor na rabeta), mas com um volume maior no bico a prancha muitas vezes acaba perdendo velocidade se você quiser fazer aquela linha mais clássica trocando muita borda. Ou seja, pra extrair tudo o que essa prancha tem, você vai ter que tentar surfar um pouco da maneira explosiva que Guilherme Tâmega faz já a bastante tempo. Cavadas rápidas sempre mirando o lip e extrapolando o limite nas manobras aéreas. Pra quem compete e treina sempre nesse estilo, é uma ótima pedida, e a identificação com o hexa-campeão mundial é quase que automática em cima dessa prancha.

GT Boards Mega-T 42.5″ PP

Bloco: Polipropileno 1.9 lb com tela simples logo acima do fundo

Deck: Polietileno 8lb NXL (PE poroso)

Fundo: Surlyn

Stringer: Simples de carbono

Rabeta: Crescente/Swallow

Bordas: 60/40

Preço: R$1199 (a venda nas principais lojas online como UV Store ou também lojas físicas, como a Surf Trunk em Santos – SP)

Prós: Prancha bem robusta e de construção sólida, com materiais modernos (PP e Surlyn) e shape bem adaptado às condições brasileiras.

Contras: Bloco um pouco mais grosso que o normal do mercado atual, dando uma dureza extra (o que pra muitos pode ser bom). Pode ser um problema em ondas muito rápidas quando nova. Logos do deck saem com facilidade.

Agradecendo sempre ao Rodrigo Nattan pelas fotos de ação, sem ele esse blog seria impossível de ser feito. Mais do trabalho íncrivel dele pode ser conferido nesse link do Instagram.

Como eu disse no começo desse post e também no último post sobre o Viper, sou representante da Science aqui em SP desde o final do ano passado. Isso obviamente acaba limitando um pouco os assuntos e reviews desse blog, inclusive esse review ficou meio em standby também por causa disso, imagino que haja aí um pequeno conflito de interesses. Só segui em frente com esse review por já ter combinado tudo e recebido a prancha pra teste. Vou assim procurar outros assuntos por aqui e não ficar tão limitado aos reviews, espero que entendam.

Obrigado e até a próxima, te vejo na água!

 

Test Drive: Delta Viper 2.0

Bom, como eu imagino que muitos aqui também me acompanham no Instagram, devem ter visto que no final do ano passado recebi uma proposta para ser representante da Science Brasil aqui em São Paulo pelas mãos de um dos maiores atletas da história do esporte no Brasil, o capixaba Magno Passos.

Ainda estou adaptando minha rotina de trabalho diário durante a semana aqui em São Paulo (trabalho como diretor de arte numa produtora de vídeos) junto com essa nova tarefa, então os posts por aqui ficaram meio parados mesmo, não teve jeito.

Além de ter ficado muito lisonjeado com esse convite, percebi uma grande oportunidade de usar equipamentos que eu sempre achei dos melhores do mercado (e que muitas vezes já usava), não só pela enorme qualidade mas também por toda a história e conhecimento da lenda viva chamada Mike Stewart. Nunca escondi de ninguém que a minha própria história e experiência no esporte é em grande parte graças ao Mike, a influência dele na minha geração foi enorme. Eu cresci vendo todo o domínio do havaiano durante anos a fio, tanto na cena competitiva mas principalmente em tudo o que se relaciona a estilo, linha de onda, e a partir de 1998 com equipamentos, no lançamento da Science Bodyboards (que na época foi inicialmente lançada como “Mike Stewart Science”).

O Delta Viper 2.0 além de bem funcional, tem um design limpo e bonito. Foto: Science Brasil

No final de 2017 a Science Brasil recebeu um enorme carregamento de pranchas, como muitos já devem ter visto nas minhas postagens no Instagram, e também nas principais lojas online disponíveis aqui no Brasil. Logo em seguida chegou no Brasil (e praticamente ao mesmo tempo que no resto do mundo) a nova versão do pé de pato assimétrico assinado pelo Mike, o chamado Delta Viper. Eu já tinha usado a primeira versão durante uns meses em 2014/15, mas acabei não me adaptando muito por ter ficado justo demais no meu pé.

Aqui faço um parêntesis essencial: cada pessoa tem os pés num formato bem pessoal, quase que único. Tamanho (comprimento) é apenas uma de muitas variáveis na hora de um pé de pato ou nadadeira te servir direito e não incomodar dentro d’água. O que eu escrevo aqui é em relação a minha experiência ao longo de todos esses anos com o formato de pé que eu tenho, ok? Recomendo sempre provar o pé de pato antes da compra, se possível obviamente.

Usei durante muito tempo os famosos Churchill e suas variações. Sempre me serviram como uma luva, o tamanho ML se encaixa perfeitamente no meu pé 42. Tive também os Limited Edition, Stealth S2/S3 e até o recente Vulcan. Mas os preferidos sempre foram os Churchill tradicionais ou os australianos Limited Editions, pela boa relação entre dureza, propulsão e conforto.

Um dos meus primeiros dias usando o Delta Viper, com boas ondas aqui em SP. Foto: Rodrigo Nattan

Quando a Science Brasil me mandou os novos Delta Viper, fiquei bem empolgado pra usar principalmente por ter visto Mike falando num vídeo que a principal mudança tinha sido na parte interna, o que a gente acaba chamando de “foot pocket” (na tradução direta seria algo como o “bolso onde vai o pé”). O pocket teria ficado mais arredondado na sola (apertando menos o pé em geral), e o durômetro (que é a relação de dureza das borrachas em geral) tinha sido revisto também. Imaginei que essa versão poderia ser um pouco mais larga por dentro e que aí acomodaria melhor meu pé, que ficava com o dedão meio esmagado por cima na versão antiga. Fora também as cores bem bonitas e diferentes (o azul/amarelo é o meu preferido). 🙂

As principais diferenças do Delta Viper em relação ao Churchill são as saídas de água direcionais (nada daquele buraco pouco funcional em baixo) e o desenho mais reto da barbatana, com um “dente” na parte virada pra dentro. Esse dente garante mais controle em ondas cavadas, já que essa parte interna da perna “de fora” é a que fica mais tempo em contato com a água, junto obviamente com a sua perna “de dentro”. Outra característica marcante é o fato da barbatana ser um pouco mais curta que o normal, isso garante sempre uma pernada mais curta e rápida, mas ainda bem eficiente. O que eu percebi é que naquela pernada forte pra entrar na onda você acaba batendo a perna mais rápido e em movimentos mais curtos, com uma propulsão ótima. A ideia nesse momento é acelerar o mais rápido possível (pra chegar na mesma velocidade da onda) e o Viper é perfeito nesse quesito. Conversei com dois amigos que também estão usando o Delta Viper e esse relato da pernada mais curta foi idêntico e positivo. Na onda o Delta Viper é bem leve e segura super bem na parede e em despencadas. Na maioria do tempo dentro d’água nem lembrei dele, o que é um ótimo sinal.

Saídas de água direcionadas e a tal ponta interna que segundo Mike Stewart garante mais controle. Foto: Science Brasil

Quanto ao tamanho e o fato de apertar os dedões, no primeiro mês isso aconteceu um pouco, mas agora já parece que a borracha pegou um pouco o formato do meu pé, encaixando como uma luva. Já me sinto 100% adaptado e nem lembro mais dos Churchill que eu tanto gostava.

Outro detalhe que eu tenho visto muito por aí e queria comentar aqui. Vende-se muito a tal ideia do “made in Malaysia” (fabricado na Malásia / borracha da Malásia), que apenas as nadadeiras fabricadas lá são boas e etc. Isso começou depois que a Morey passou a fabricação dos Churchill para a China para cortar custos, e a qualidade dos pés de pato deles caiu imediatamente. Os Delta Viper são fabricados em Taiwan, e eu achei a borracha e a construção geral deles muito boa, no nível de outras nadadeiras, com a borracha super lisa e bem acabada (o que diminui a possibilidade daquelas feridas).

O Delta Viper é leve e não incomoda em dias pequenos ou trocas de borda, como nesse bat-invert aqui. Foto: Rodrigo Nattan

Então o que eu reforço aqui é o fato de que apenas o lugar onde é fabricado não é uma garantia 100% da qualidade. Uma fábrica pode comprar borracha na Malásia e fabricar seus pés de pato em Taiwan, como é por exemplo o caso do Delta Viper. O ideal é sempre que possível ver ao vivo e provar o pé de pato na loja.

Por enquanto não tenho nenhum ponto negativo como destaque no Delta Viper, e também só recebi feedbacks positivos de quem já está usando. Outro detalhe legal é o preço encontrado nas lojas, abaixo de concorrentes nacionais por exemplo. Ponto pra Science Brasil que conseguiu disponibilizar um produto de alta qualidade no mercado nacional (com todos os problemas que envolvem importação aqui) com preço competitivo.

Delta Viper 2.0

Nadadeira assimétrica de borracha, com saídas de água direcionais

Tamanhos: M (39-40), ML (41-42) e L (43-44)

Fabricação: Taiwan

Preço médio: entre 300 e 350 reais dependendo da loja

Onde encontrar: Direto com a Science Brasil (@sciencebrasil), lojas online dedicadas (UV Store, Meu Bodyboard) ou revendedores oficiais com loja física, como a Surf Trunk em Santos – SP e a Vortec no Rio de Janeiro.

Fotos das nadadeiras – Science Brasil / Fotos de ação – Rodrigo Nattan

É isso, espero conseguir voltar a escrever mais por aqui. Muita gente me pede sempre mas do ano passado pra cá foi meio complicado mesmo. 😦

Agradeço também a Science Brasil por todo o suporte até agora, e ao Magno Passos que é um apaixonado pelo esporte como todos nós.

Até a próxima, te vejo na água!